“Till, a Saga de um Herói Torto”, traz de volta o melhor do Galpão.
Nada melhor que ver o grupo Galpão em essência: teatro popular da melhor qualidade, tanto para o palco quanto para as ruas; espetáculo daquela simplicidade que comunica ao raciocínio e à sensibilidade – ou seja, atinge duplamente; de comunicação objetiva – nada está ali em excesso; e a serviço da investigação da realidade brasileira; com música e dança; e leve, e alegre, como é a alma brasileira.
Figurinos, cenários e adereços, iluminação, som, tudo muito funcional e, sobretudo, muito presente. E atores
que respiram esse teatro, criativos e tecnicamente perfeitos na linguagem dos
bufões. Toda a criação a partir do belo texto de Luis Alberto de Abreu (de Bella Ciao e O Livro de Jó), levado de
forma fluída até desembocar no espectador com a força de uma celebração.
“Till, a Saga de um Herói Torto”, marca os 40 anos desse grupo
formado por atores e no qual parece que toda a equipe funciona com esse espírito. E que mantém a base dos fundadores e a mesma essência desde
a criação.
Característica particular e que influenciou vários outros grupos,
não há no Galpão a presença de um diretor fixo. “Nossa característica é encontrar pessoas, experimentar linguagens e
mergulhar em processos diversos. O que marca o Galpão são os encontros, tanto
com o público quanto com os diversos criadores que estiveram junto conosco
nessa trajetória de 40 anos”, explica a atriz Inês Peixoto.
No caso de Till, porém,
a direção é de Júlio Maciel, um dos componentes. Talvez nisso resida
tanta fluidez, em nível profundo, de todos os criadores. O que nem sempre
aconteceu pois embora a ânsia pelo encontro, pelo aprender, pelo
experimentar, seja atávica neste elenco,
alguns poucos encontros com diretores resultaram em espetáculos pouco fluídos.
Abaixo, do release, que fala melhor que eu:
“A peça mostra Till como um
típico anti-herói cheio de artimanhas e dotado de um irresistível charme. Um
personagem encontrado em várias culturas, que se assemelha ao nosso Macunaíma
ou Pedro Malasartes. A saga cheia de presepadas e velhacarias começa com
uma aposta. O Demônio diz a Deus que se fosse tirado do homem algumas
qualidades o ser humano cairia em perdição. Deus, aceitando o desafio, resolve
trazer ao mundo a alma de Till. Vivendo em uma Alemanha miserável, povoada de
personagens grotescos e espertalhões, logo de início o protagonista é
abandonado em meio ao frio e à fome e descobre que a única maneira de
sobreviver naquele lugar é se tornar ainda mais esperto e enganador.
Além de Till e uma infinidade
de rústicos personagens medievais, a peça conta também a história de três cegos
andarilhos que buscam a salvação sonhando alcançar as torres de Jerusalém
e lutar pelas cruzadas da
cristandade. Quem interpreta Till é a atriz
Inês Peixoto, que está no Grupo Galpão há 30 anos. Ela vê a peça como uma
tragicomédia repleta de camadas. “O espetáculo é como uma cebola: vai
descascando e entendendo que atrás daquela situação visível tem outros
problemas relacionados, como a questão social e política, a corrupção, a
religião, o abandono da infância, entre outros”.
Till não queria nascer. Ele
fica 5 anos na barriga da mãe e vem ao mundo sem perspectivas. Sobrevive sem
ter capacidade de compreender a sua própria condição, pois vende a consciência.
“A grande questão do Till é alma e o corpo desconectados de consciência. É o
que o sistema cria: pessoas cada vez menos conscientes, preocupadas apenas em
sobreviver. É mais fácil manipular massas que não têm consciência”, avalia Inês Peixoto, que
interpreta a personagem que dá nome à peça.
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