FESTIVAL DE CURITIBA 2024 - DUETOS... PODERIA SER MAIS QUE COMÉDIA BÁSICA
UMA COMÉDIA CERTINHA
Pelo menos na adaptação brasileira, o texto de Peter Quilter nada de novo traz em termos estéticos. Tampouco examina ou desenvolve qualquer questão. Segue as regrinhas da comédia de sketches bem feita. São personagens do cotidiano de classe média-alta, envolvidos em situações vividas por muitos: encontro via aplicativo, festa de aniversário, antes do casamento e antes da separação. Não exatamente nesta ordem e os quadros não têm relação entre si. Em todos, o tema são os desejos e os medos de cada um. Sem profundidade, apenas para a plateia rir da semelhança com sua realidade. Mas é texto bem feito, com piadas inteligentes e, uma ou outra, muito boa.
Comédias assim são prato cheio para o bom desempenho de atores, porque o texto anda sozinho, basta estar no personagem e na situação. Ou seja, sobra espaço para bons atores criarem detalhes e, mais ainda, personagens fisicamente interessantes.
Eduardo Moscovis e Patrycia Travassos até que criam, mas sem grandes arroubos. Ele, no primeiro quadro – em que interpreta um homem em um encontro por aplicativo – traz ótima construção tanto de personagem físico quanto de aproveitamento cômico. O que cria expectativa para os próximos quadros. E não acontece. São atores de potência e com muita estrada. Mas que, aqui, não decolaram.
O ESPETÁCULO
A direção parece que abre mão de existir. Deixa os atores completamente livres nos espaços, dando-lhes duas poltronas, uma mesinha e coisa e tal. Resultado, ambos andam pra lá e pra cá, ora se distanciando, ora se aproximando, dificilmente param de andar. E isso nos quatro quadros, de forma basicamente igual. Não se explora regiões da cena, pouco se explora as relações corporais, cômicas e dramáticas. Cansa um pouco. O que diferencia... é o texto.
Talvez, um pouco mais de presença da direção poderia provocar no casal de atores material mais rico. Que, com certeza, têm.
O espaço ficcional de cada quadro é ora uma sala, ora um quarto. Cenicamente, foi traduzido em um mesmo espaço, com os poucos objetos que descrevi. Sim, econômico, para dar ênfase aos atores e suas interpretações. Mas se poderia utilizar móveis diferentes – ou com detalhes diversos - para indicar os diferentes lugares em que os quatro encontros acontecem. Seria mais rico.
Há dois camarins, ao fundo, em que os atores trocam de figurino enquanto os contra-regras mobilizam o cenário. Bacana. Mas existem enormes panos translúcidos que dão conta de criar uma ambientação e separar os espaços da cena e dos camarins. Além de um pouco desajeitados, chamam a atenção. Talvez o palco sem eles ficaria mais limpo. Os espaços seriam sinalizados pela iluminação. Um palco limpo potencializaria a percepção do texto e o desempenho dos atores. Que é o que este espetáculo se propõe a oferecer.
Os figurinos e adereços caracterizam os personagens e, estes sim, oferecem alguma possibilidade de comédia física. Alguma.
A iluminação quase sempre é usada apenas para separar os espaços de cena e de camarins. Poucas vezes, cria um estímulo emocional. Se a direção utilizasse melhor as relações dos atores com o espaço e o espaço entre eles, brincando com sensações dramáticas e cômicas, a iluminação poderia ter acompanhado.
A sonoplastia funciona tal qual a iluminação. Talvez um pouco mais efetiva em criar recursos cômicos.
MUITO MOVIMENTO
Assim como os atores praticamente não param de se mexer pra lá e pra cá, tampouco param de falar. Ok, se o tema, aqui, for a ansiedade humana, faz sentido. Mas é preciso Silêncios".
Dos poucos momentos em que cai um certo silêncio, saem as melhores piadas. Quando falo em silêncio, não falo apenas em som, mas também em movimento visual. Silêncios também conferem profundidade, também podem ser uma poderosa passagem do cômico ao dramático ou o oposto. Silêncios pesam.
Silêncios revelam. Silêncios criam expectativa.
Mas, em Duetos, pouco usados. Como após o beijo, no segundo quadro, um dos momentos hilários do espetáculo.
Quem assistiu Intimidade Indecente, com Marcos Caruso e Eliane Giardini, há um ano neste mesmo Guairão, vai entender o teor de minhas apreciações. Lá, existia tudo do qual falo aqui.
Este comentário se refere ao espetáculo que assisti neste festival. Pode ser que, em suas temporadas anteriores, possivelmente em teatro menor e mais intimista, como o Teatro dos 4, no Rio de Janeiro, ele tenha tido outra potência. Sim, faz toda diferença o espaço e a relação com o espectador.
O Guairão, com a distância que gera, é para poucos. E com certeza não é o melhor espaço para muitos tipos de espetáculo.
Detalhe. Valeu a pena ter ido, foi ótimo para relaxar e dar algumas risadas. E o público parece ter gostado muito. Ao final, aplaudiu de pé.
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